Entrevista - Vegas: Nunca explique, Nunca se queixe


Vegas é um daqueles casos curiosos, mas intrigantes de apresentar: Pouco se sabe sobre quem e como são, o máximo que se sabe é que a origem da banda foi na Alemanha. Mas sua música e atuação enigmática fazem parte do charme único que essa banda tem. Sua origem foi durante a virada do terceiro milênio, contando com um álbum e vários ep's e splits, criaram um certo interesse por aqueles que procuram uma vertente mais diferenciada no hardcore.

Ao escutá-los, nota-se uma sonoridade que remete a crueza e ferocidade do hardcore/punk metalizado de bandas como GISM e Integrity, misto com a ferocidade e cadência de bandas mais clássicas como Negative Approach e Lifeslood, alternando com experimentalismos e faixas acústicas. Todo esse imaginário fonográfico é acompanhado de letras introspectivas que abordam assuntos como individualidade, a passagem de tempo e auto controle com um vocabulário deveras abstrato e elíptico. 


Recentemente eles lançaram a compilação "Quanto Mais O Nada, Melhor", dedicada completamente para o público sul americano, pelo selo Psychic Rebellion. Já aproveitando o lançamento do disco, tivemos uma conversa com o T,membro constante e mente responsável pelo evasivo e misterioso grupo:


Bem, primeiramente agradeço por ter tempo para nos responder. Acho que vamos começar a entrevista com uma pergunta básica: Como o Vegas foi formado? Quais foram as influências do grupo no início?

No começo tudo era preto e branco. Vegas foi criado como uma banda punk, imaginando o que eu queria foi o começo. Você faz o que imagina e no fim das contas você cria o que você é.

A música de vocês tem um contraste de estilos interessante, no mesmo tempo que a banda cria uma sonoridade hardcore feroz e barulhenta, vocês também tem espaço para algo mais experimental e faixas acústicas. Conte-me mais sobre como é o processo de composição:

As composições vêm à tona naturalmente. Não há nenhum processo programado para escrevermos nossa música. A musa inspiradora faz todo o trabalho, quando o clima surge a tinta é derramada na tela.


Do que se sabe, você é o único membro constante na formação do Vegas. Você acha que essa alternância de membros adiciona nas composições ou limita você?

Vegas começou a ter uma vida por si só e virou minha companhia faz um bom tempo. Neste momento trabalho com músicos que não se interessam por tecnologia ou comunicação. Estou amando isso.

Alguma idéia de quantos colaboradores já passaram pela existência do grupo? Há algum motivo para essas constantes mudanças de formação?

Não há nenhuma “necessidade” por uma mudança. Pessoas vem e vão e as prioridades mudam. Vegas nunca se preocupou em seguir alguma fórmula e nem se confina estilisticamente numa delas. Não temos um público alvo, trabalhamos e compomos quando nos sentirmos inspirados pra isso.


Falando sobre lançamentos, vocês recentemente lançaram a compilação “Quanto mais o nada, melhor” por um selo brasileiro. Como foi o lançamento e porque o interesse num lançamento no continente sul americano?

Rodrigo bondosamente nos ofereceu a oportunidade de lançar esse CD pela Psychic Rebellion. A América do Sul, particularmente o Brasil, é uma parte do mundo que sempre despertou minha curiosidade. Olho Seco teve um 7’’ que foi lançado pelo selo alemão Pogar, que chamou minha atenção enquanto colecionava discos na minha adolescência. Tentativas frustradas de conseguir uma cópia de “Heute Spass, morgen Tod”, do Vorkriergsjugend pelo selo brasileiro New Face Records me estabeleceu os primeiros contatos com os admiradores de punk rock do continente sul americano, o que me apresentou bandas como Ratos de Porão e a coletânea Grito Suburbano.


Olho Seco? Interessante, normalmente o pessoal de fora relaciona a cena brasileira mais com nomes como Ratos de Porão. Alguma outra coisa da música brasileira ou bandas que despertam seu interesse ou curiosidade?

Gostaria de me aprofundar mais no funk carioca, vi alguns shows da M.I.A. e a influência dela no gênero chamou minha atenção. O “Movimento Música Viva” (Nota do editor: creio que se refere ao Grupo Música Viva) e a natureza dos cânticos da capoeira são os tipos de coisas que gostaria de presenciar e experimental pessoalmente, assim como canções com grande presença de percussões como o maracatu.

Também tenho curiosidade de ver as versões musicadas da literatura de cordel.


Vegas também é conhecido por seus lançamentos limitados e “versões da banda”, seria isso uma tática para aproximar mais os fãs da sua música ao grupo? Conte-me mais sobre isso:

Bandas conseguem cópias exclusivas e coisas como “edição do artista” são formas de tornar a compra de discos algo mais especial, algo menos mundano do que as edições regulares, além de uma certa forma de premiarmos as pessoas que prezam a buscar e comprar o material diretamente da fonte.

Você também é conhecido por ser um viajante prolífico, por quantos países você já passou até agora? Porque o interesse nesse estilo de vida?

Eu creio que estou chegando a 60 países que já visitei até agora. Viajar e se expor a novas experiências ajuda a manter o sangue fino.


Você já visitou a América do Sul? Se não, o que te interessa na região se você ainda pretende viajar por aqui?

Infelizmente não tive a chance de visitar o continente ainda, como ainda é um terreno desconhecido pra mim, pretendo manter os meus interesses os mais abertos possíveis. Espero experimentar o terreno do “cone do sul” o mais breve possível, antes tarde do que nunca!

Falando em viagens, experiências e mente aberta: O que você pensa sobre nacionalismo e estereótipos? 

O nacionalismo é uma doença infantilizada, fome por poder temperada por auto enganação. Um narcisismo coletivo em seu mais baixo denominador comum.

Já os estereótipos vão infelizmente existir sempre, mas devemos fazer um esforço coletivo em não ver o mundo por um prisma que seja refletido por isso. Quando você observa o mundo e se mantem por estereótipos é pura preguiça e pintar uma tela com um pincel extremamente grande, sem texturas ou detalhes. 

Vegas sempre foi e sempre vai tratar sobre individualismo e manter sua alma viva, ao invés de dizer amém para tudo que o mundo te dizer simplesmente. Pense por si só, não siga cegamente o fluxo, questione tudo! 

Mas também acredito no direito inalienável de alguém ir para o inferno de sua própria maneira.


Em um momento de suas carreiras. Você, Dwid Hellion (Integrity), Nick Fiction (Pale Creation) e outros músicos criaram um projeto interessante chamado Roses Never Fade. Como surgiu a idéia e como foi as gravações desse trabalho?

O projeto começou durante a turnê europeia do Integrity em 2003, no ônibus do grupo. Absinto, quantidades massiva de atum, molho de tabasco, frappuccinos de baunilha, coleção vintage de casacos militares Abercrombie, cervejas Duvel, Sintra, um bunker sem janelas, cadeiras rangendo, Journey e cigarros mentolados foram peças que tiveram um papel essencial na criação pálida de Roses Never Fade.

Num split mais recente com o Integrity, ambas as bandas fazem versões de músicas que estão na trilha sonora do filme “O Diabo É Meu Sócio”. Como surgiu esse conceito? 

Sempre fui um fã da genialidade humorística de Peter Cook e Dudley Moore.


Se pudesse, haveria algum outro filme que você quisesse fazer versões? 

Na verdade, não.


Falando na sétima arte, algum filme que viste recentemente e te deixo uma boa impressão?

Não tenho tanto tempo para ver muitos filmes hoje em dia.

As apresentações ao vivo de Vegas são bem raras, algum motivo para isso? Há planos de mais shows ao vivo no futuro?

Seria muito interessante tocar no continente sul americano!


Como somos um blog de música, faremos aquela pergunta inevitável: O que você tem escutado ultimamente? Que bandas e músicos te ajudaram a formar a música que você fez pro Vegas e seu gosto musical ou visão do mundo?

Eu escuto todos os tipos de músico, principalmente quando estou correndo. Eu tento escutar um álbum novo a cada dia. Músicos e bandas não me ajudam a formar tanto assim uma visão do mundo, mas aqueles que me interessam sem dúvida ampliam essa visão.

E há alguma coisa que você gostaria de recomendar o pessoal a ouvir? 

Kollegah


E como somos um blog brasileiro, vamos pra outra questão óbvia: Alguma coisa na cultura ou história brasileira que tem seu fascínio?

Por onde eu começo? A linguagem (aparentemente a variante brasileira do português incorporam influências indígenas e africanas no seu vocabulário), o adeus para as coisas ruins numa sessão de disciplina para praticar redenção e se preparar para morte e ressureição de Cristo (sim, estou falando do Carnaval), assim como brigadeiros e beijinhos para satisfazer minha gula.

Também é difícil não gostar da arquitetura manuelina, os trabalhos literários de Machado de Assis e as habilidades e dribles de Pelé.


Quais os planos futuros do Vegas para o momento?

Novos lançamentos a caminho: Um limitadíssimo lathe cut e um novo Split 7’’ com um de nossos amigos.

T, muito obrigado pela entrevista, alguma última mensagem para os leitores?

Ajuda-te que deus te ajudará.



É isso então galera, se vocês querem saber mais da banda, acesse o facebook ou o bandcamp deles. E para quem estiver interessado em obter uma cópia do compilado "Quanto Mais O Nada, Melhor", só contatar a página do selo Psychic Rebellion.


X-Ray Spex: Berros e Day-Glo contra a sociedade de consumo




                      
 O X-Ray Spex continua sendo um dos segredos mais bem guardados não só do Punk Rock, mas do rock n’ roll de forma geral. Apesar de terem gravado pouco, seu disco de estréia é musicalmente tão impactante e abrasivo  quanto o “Nevermind the Bollocks” ou a estréia dos Ramones. E a frontwoman Poly Styrene com seu vocal gritado e desleixo com a aparência física , foi uma das principais pavimentadoras do caminho para o riot grrrl surgir 15 anos depois. Como a revista Billboard afirmou, "Poly é o arquétipo da roqueira moderna."
                               
Tudo começa em 1976, quando uma garota hipponga e esquisita de aparelho nos dentes  chamada Mary Joan Elliot assiste a um show dos Sex Pistols. Assim como aconteceu com Joe Strummer (The Clash) e Steve Shelley (Buzzcocks), a apresentação muda totalmente os projetos de vida da moça, que decide montar uma banda no mesmo dia.
Coloca classificados no jornal e em pouco tempo o X-Ray Spex estava formado: Jak Airport na guitarra, Paul Dean no baixo, Paul ‘B.P.’ na bateria e Lora Logic (na época com 16 anos) no saxofone. Mary se batiza com o nome artístico de Poly Styrene e se torna a vocalista do grupo.
                             
Poly tinha aparência física diferente do punk rock inglês predominantemente branco (o pai dela era somali) e com uma presença de palco amalucada e vocais prá lá de esgoelados, a banda chamava muita atenção. A presença de saxofone numa banda punk fazia tudo ainda soar mais doido e exótico. O visual abusava do Day-Glo, mas ao contrário da new wave, esse recurso era propositalmente contra o glamour e o senso estético. Visualmente pareciam uma banda new wave dos pobres. Eram mesmo absolutamente singulares. Até o ranzinza John Lydon, que só abre a boca prá desmerecer o que quer que seja, recentemente afirmou que a única banda que os Pistols temiam dividir um show era com o X-Ray Spex.
                               
Com essa formação em 1977 lançam o single “Oh bondage up yours”, a música mais conhecida deles e tida como o maior hino punk feminista.
                             
Um ano depois vem o álbum “Germfree Adolescents” , já sem Lora Logic, que deixa a banda prá se tornar hare krishna e é substituída por Steve “Rudi” Thompson, que aproveita todas as linhas de sax criadas por Lora. O disco é um arregaço. Talvez o caso que eu conheça de maior obra-prima que não teve o devido reconhecimento de público e até mesmo de crítica. Todas as faixas são excelentes, com uma fluidez incrível e sem pausa prá respirar. A produção é acertada e a a gravação alta e clara para os padrões de época e estilo. A combinação de guitarra e saxofone é perfeita, a guitarra fazendo mais o papel ritmico e deixando a melodia por conta do sax. A guitarra também é mais influenciada pelo hard rock da década do que pelo rockabilly ou as garage bands dos 60’s, como geralmente ouvimos na maioria das outras bandas punk. As letras falam de consumismo e artificialidade de forma inteligente e partindo de uma perspectiva mais pessoal (“1977 e nós estamos enlouquecendo. É 1977 e nós vemos muitas propagandas. Eu como Kleenex no café da manhã.E uso papel higiênico Weetabix para secar as minhas lágrimas”).Mas o maior destaque do disco são mesmo os vocais: entrega, paixão, energia, credibilidade. A voz de Poly Styrene é uma obra de arte.
                           

Exausta pela vida na estrada e uso de drogas, Poly passa mal num show em 1978 e começa a ter diversas crises depressivas. Afirmou ter visto um disco voador cor de rosa pela janela do quarto. Isso a assustou muito e sem saber o que fazer e o que isso poderia significar, decide abandonar o universo do  Punk Rock e optar por um caminho mais espiritual de vida. Sai então da banda em 1979. Os outros integrantes ainda tentaram arrumar outra vocalista, mas, sem sucesso, o X-Ray Spex acaba oficialmente um ano depois .
Assim como Lora Logic, Poly se torna hare krishna também e lança em carreira-solo “Translucence” em 1980, um disco bem tranquilo e meditativo, que em nada lembra o som de sua antiga banda.
Poly Styrene e Lora Logic em 1980. Hare Krishna Krishna Krishna Hare Hare
Com o sucesso do Green Day e Offspring em meados da década de 90, diversas bandas punk das antigas retomaram atividades, aproveitando-se do momento propício. O X-Ray Spex também faz um breve retorno, chegando a gravar um disco, “Conscious Consumer”. Contrariando a tendência das bandas que voltam depois de muito tempo, é um disco que surpreende bastante e muito bom de ouvir.
                                   

Nos anos 2000’s  se reuniram esporadicamente diversas vezes para fazer shows. Um deles, no Roundhouse, foi lançado em cd e dvd.
                                  
Infelizmente Poly Styrene morre em 2011 de um câncer de mama em estágio avançado, aos 53 anos, deixando muita saudade.
Recentemente mais material solo inédito dela foi lançado e diversos tributos realizados.
                                 
                                         
Não se atendo aos padrões que surgiram do próprio punk rock, Poly é símbolo de originalidade e inspiração num mundo de clones, posers e wannabes. Uma artista mais instintiva do que intelectualizada, como costumam ser os melhores da categoria. Ainda que tenha brilhado com todo seu explendor por pouco tempo e para relativamente poucas pessoas num determinado período, o impacto que causou na cultura pop e nos corações de quem foi tocado por seu trabalho é forte demais, deixando a melhor lição possível de “do-it-yourself".  Poly Styrene, descanse em paz onde estiver. Nós te amamos!

The Germs: Dianética a Serviço da Perversão

                       

Manipulador, paranóico, sensível, temperamental, autodestrutivo, gênio. Esses são os adjetivos onipresentes que o líder do Germs e ícone punk Darby Crash recebe de quem conviveu com ele.
Nascido com o nome de Jan Paul Beahm, Darby teve uma infância difícil. Seu irmão morreu de overdose quando ele tinha 11 anos, a mãe tinha problemas mentais e seu padastro sofreu um enfarte fulminante, deixando a família em dificuldades financeiras.
 
Na adolescência ele ingressa numa escola de caráter experimental, com bases na cientologia e que o objetivo seria formar futuros líderes e personalidades influentes da América. Dentre os colegas de escola de Darby, ele estudou com Kira Roesller (futura baixista do Black Flag) e lá também conheceu Pat Smear, seu  melhor amigo e futuro membro do Germs. Darby gostava de chocar e diversas vezes aparecia de cabelo tingido de azul nas aulas, para se sentir como um negro por um dia, como ele costumava dizer. Apesar da rebeldia, ele admirava a metodologia da escola. Isso, somado com o uso constante de LSD, tornou-o obcecado por controlar as pessoas e “brincava” de fazer lavagem cerebral nos colegas. Dentre seus ídolos estavam Hitler, Charles Manson, Osvald Spengler, Nietzsche e o próprio Ron L. Hubbard (o fundador da cientologia). Também gostava do lado fascista do rock, principalmente David Bowie na fase Ziggy Stardust.
 
Darby com Alice Bag, outra figura icônica do cenário punk de Los Angeles 
Em meados da década de 70 o cenário pré-punk de Los Angeles era ainda bem ligado no glam rock e não tinha as pretensões vanguardistas do que acontecia em New York. David Bowie era deus e as Runaways foram quem mais deu certo na cidade fazendo esse tipo de som.

Darby então decide ter uma banda e depois de diversas formações, se estabiliza com ele nos vocais, Pat Smear na guitarra (nessa época ele ainda não sabia tocar), Lorna Doom no baixo (Darby sabia do marketing que era ter uma integrante mulher) e o hippongo maluco de pedra Don Bolles na bateria.
Baseando-se na música “Five years” do Bowie, Darby traçou um plano de 5 anos para sua carreira musical. Seu objetivo era se tornar um grande astro do rock e morrer. Ele afirmava querer criar um exército de seguidores, à maneira do nazifascismo. Darby bolou então um logotipo, um círculo azul, que simbolizava a natureza cíclica da vida.

Darby era bissexual mas sempre teve relacionamentos estáveis com mulheres, agindo como gigolô, recebendo delas casa, comida e dinheiro prá drogas. Sem técnica nenhuma  e viciado em todo tipo de entorpecente, suas performances eram prá lá de caóticas, lembrando a de seu ídolo Iggy Pop, envolvendo automutilação, vômitos, insultos e muita violência. Niilistas ao extremo, sacanearam o Damned numa apresentação em que abriram para eles, jogando farinha de trigo nos “ingleses mauricinhos”.
Os Germs gravaram  um único álbum em 79, chamado “GI”, produzido pela ex-Runaways  Joan Jett. A intervenção da Joan no disco é mínima, já que ela antes tinha bebido e se drogado com a banda e passou a maior parte do tempo das sessões em coma alcóolico. O resultado é um dos discos mais mal gravados da história.  Isso não impediu de GI (Germs Incognito) ser um clássico instantâneo. Sujão, abafado, mixagem pavorosa, mas com músicas muito inspiradoras e empolgantes. A falta de apuro técnico acabou dando até personalidade e um certo charme pro trabalho. Darby também era muito culto e suas letras são muito superiores a bandas contemporâneas a eles. 

Pouco depois a banda participou do documentário “Decline of western civilization”, um dos poucos materiais que se tem deles e uma das últimas coisas feitas por Darby. Ele se afundava mais e  mais na heroína e isso é bem evidente no filme.
Pouco depois, ele faz uma viagem para a Inglaterra e se apaixona pelo estilo "new romantic" do Adam & The Ants. Ele planejava dar esse novo direcionamento prá sua música. E também adotou o corte de cabelo moicano, à maneira de Adam Ant na época.

Retorna aos Estados Unidos com esses planos, mas já bastante cansado, não suportando o estilo de vida que levava e sem esperanças de se recuperar, se suicida provocando uma overdose intencional de heroína e morre em 7 de dezembro de 1980 aos 22 anos. O “Five year plan” se concretizou!  Uma curiosidade é que ele morreu no mesmo dia em que o John Lennon foi assassinado e sua morte passou despercebida.     
Com a morte de Darby e o fim dos Germs, Pat Smear ficou sumido por muito tempo  e “renasceu” depois que virou integrante do Nirvana. Logo depois virou guitarrista do Foo Fighters, permanecendo até hoje com eles  e contribuindo para a merda de banda que são. Lorna nunca mais deu as caras. Don Bolles aparece em tudo quanto é documentário e se isso é possível, a cada dia aparenta estar mais lesado. Diversas compilações e bootlegs foram lançados desde então. Em 2007 o Germs ganhou uma cinebiografia “What we do is secret” e foi descoberto por uma nova geração.
 
Cena do filme "What we do is secret", de 2007 
Darby Crash continuou muito influente, tendo inspirado bandas e artistas como Poison Idea, GG Allin e Kurt Cobain. Contraponto saudável e  necessário à fiscalização ideológica e mentalidade de gueto de grande parte do hardcore da década de 80 até os dias de hoje.

Ele afirmava que queria que as pessoas o seguissem e predisse que um dia fariam orações prá ele como para uma entidade divina. Parece que conseguiu seu intento.

Entrevista - Bandanos

Faz um tempo que não postamos nada, nós sabemos. Mas para sua alegria, voltamos com uma entrevista dos Bandanos. Aproveitamos a passagem deles aqui por Porto Alegre, na turnê do novo álbum "Nobody Brings My Coffin Until I Die" e fizemos várias perguntas.


Mas primeiro uma introdução: Bandanos é uma banda de thrash/crossover formada em São Paulo, formada em 2002. Apesar da estética e nome remeter muito ao Suicidal Tendencies, não se deixe enganar, eles estão bem longe de ser uma cópia qualquer, só dar um play que tu nota as influências de nomes como Accüsed e Corrosion Of Conformity (principalmente pelos vocais do Crisplatterhead), além de Excel, D.R.I., entre outros. Perfeito para aqueles que curtem um thrash metal das antigas e não quer recorrer ao revival retro que rolou no país, mesmo com essa intenção de ode a época, o Bandanos consegue colocar sua própria identidade e características em suas músicas.


Com dois álbuns e uma cambada de EP's e Splits com bandas como Violator, Destruction's End, Biting Socks, Toe Tag (que tem membros do Accüsed) e Blasthrash, o Bandanos já tem seu nome bem consolidado na cena metal nacional e internacional. Abaixo segue a entrevista dos caras:

Pergunta básica pra iniciar: Como a banda começou e o que rolou nela até hoje? (turnês, formações, etc.)

Marcelo Papa: Eu sou o único da formação “original”, digamos assim. Comecei a banda junto com o Lobinho (Ex- Point Of No Return), Ruy Fernando ( Ex- no Violence), Franz (Ex- War Inside) e Alessandro Soares (NOALA). Éramos amigos de longa data e em uma conversa virtual no finado mIRC, resolvemos montar a banda, meio  despretensiosamente.  Fizemos os primeiros sons com essa formação. Mas a banda era um projetão de todos. Com o tempo ela foi ficando mais séria e as formações mudaram.  Acho que a mais marcante aconteceu quando nos firmamos como quarteto, com  o Cris assumindo o vocal, depois de ter tentado tocar baixo e o Bucho (Rot/Cruelface) assumiu o baixo. Essa formação durou 5 anos. No fim 2010 o pessoal já estava meio sem pique de fazer shows, resolvemos dar um tempo e voltamos no começo de 2011 com a formação atual, que conta com Cris na voz, eu na guitarra, Lauro no baixo e Helder na batera. Desde então,  compusemos material novo, gravamos  e estamos tocando em tudo quanto é lugar por ai. Sobre tour, já tocamos quase no Brasil todo. Em 2008 fomos pra uma pequena tour de 5 shows pelo Chile e em 2009 fizemos 29 shows por 13 países na Europa. 


Muitas pessoas associam vocês ao Suicidal (bandanos, bandanas, trocadalhos do carilho e inúmeros covers), mas se analisarmos mais a fundo, o grupo tem outras influências mais notáveis como Corrosion Of Conformity, Excel e outras bandas do gênero crossover. Na hora de composição vocês já tem a mentalidade crossover ou chegam a ter influência de elementos de outros gêneros musicais? 

Marcelo Papa : A influência de ST na banda existe e é inegável, mas sempre buscamos muito mais a estética da parada, do que se preocupar em soar igual. Temos muitas influências absurdas que nem passam perto do metal. Nosso batera é pianista e adora musica clássica. Eu piro muito em Folk, Soul Music, Rap, O Cris é do Grind. Só o Lauro que é Metal TrOO mesmo e só escuta isso ...hahaah.  O fato de soar “crossover”, com o tempo de tornou natural. Acho que quando vc tem 4 pessoas na mesma sintonia e entendendo o que querem  fazer, tudo sai mais fácil. O Helder é o mais novo na banda, mas nós já tocamos juntos em outra banda de crossover 15 anos atrás. Entrosamento e estar sempre tocando, fazendo tours, ajudam demais na hora de compor tbm. 

Lauro: nossas influencias alem do crossover também podem incluir hardcore, stoner, heavy metal, death metal, thrash metal, punk e por ai vai. Dentro dessas influencias esta todo o de composição da banda. Creio que essas bandas que você citou na pergunta acima ouviram o que nos ouvimos.


E quanto as letras? Nota-se que o conteúdo lírico vai desde coisas mais sérias (Justiça das Ruas, Azul Vermelho e Branco), temas mais debochados e informais ( Urban Thrash Skate Maniacs, Te Amo Porra), como é o processo de escrita delas e como puxam esses assuntos para serem abordados?

Marcelo Papa: O Cris sempre faz as letras. Geralmente sobre situações que nos rodeiam mesmo, mas ele também curte falar de filmes de terror,  sobre as bandas que a gente cresceu escutando, como uma forma de tributo mesmo. Tudo ali, sejam as coisas sérias, ou as mais informais, são coisas que os 4 realmente concordam em ser exposto. Acho que se você tiver o mínimo de capacidade pra escrever, assuntos não faltam nessa vida que todos nós levamos. Nesse disco novo, o Cris já tinha a maioria das letras escritas. Algumas das musicas eu compus já com os temas resolvidos, e outros ele fez o contrário. Nós escutamos as bases e ele foi desenvolvendo a letra conforme o que ele “enxergava” nas bases, digamos assim; Foi o caso de Urban Thrash Skate Maniacs. 


Ainda sobre as letras, lembro de ter lido numa zine que uma certa música de vocês fala sobre um incidente no show onde colou nazistas, que incidente foi esse e qual é a música? Se importa de falar um pouco pra nós sobre isso?

Marcelo Papa: Malandro, esse dia foi tenso! “Knock Out” é a letra que saiu logo após esse fato. Em 2004, nos primeiros anos da banda,, alguns WP/Nazis colaram na porta de um Festival Hardcore, que era organizado pelo pessoal da verdurada e rolava duas vezes por ano lá no bairro Jabaquara. Esse festival bombava! No primeiro dia, eles colaram nos arredores e começaram a aloprar a molecada  punk mais nova. Pegavam as pessoas no metro ao lado, ou nos bares próximos. Isso foi informado pra gente, que estava lá dentro do show e pros organizadores do evento. No dia seguinte, já fomos preparados, pois sabíamos que os caras deviam voltar e realmente voltaram. No meio do show recebemos o relato que uma menina havia tomado porrada dos caras por estar com sua namorada nos arredores e mais um monte de gente reclamando que os caras estavam apavorando. Não contentes, eles colaram na porta do evento e tentaram forçar a entrada. Só que nessa verdurada tinha MUITA gente. Como era um festival, tinha gente do Brasil todo.  Vou te falar que a cena que mais se iguala ao fato , é a cena do filme ‘ Coração Valente”, quando o Mel Gibson grita “ FREEEEDOMMM” e todos saem pro combate! Hahahahaha... Foi todo mundo pra cima e botaram os filhos da puta pra correr. Todo o pessoal mais velho, inclusive nós do Bandanos , nos juntamos a molecada mais nova e os Nazis tomaram um preju mosntruoso. Não gosto de violência, mas conversa com esse tipo de lixo, não existe! DIE NAZIS DIE!!


Quase toda a banda tem membros straight edge, o que é algo "inédito" pra turma do Thrash, sempre rola aquele arquétipo do thrasher alcóolatra e intoxicado. Por acaso já rolou algum preconceito por tal posição ou a galera nunca ligou muito pra isso?

Lauro: O pessoal até respeita isso ai. Tenho vários amigos que são do metal junk e sinceramente, as vezes os próprios caras admiram essa postura de resistência. Claro que rola brincadeiras, mas tudo dentro do respeito.

Marcelo Papa: Comigo também sempre rolam umas piadinhas, mas no geral é bem tranqüilo. Quando alguém vem me oferecer  alguma outra coisa, eu apenas nego, não fico explicando. Mas tem gente que fica em choque, não entende, já estamos acostumados...hehehe. 


Recentemente vocês fizeram uma segunda turnê aqui no Rio Grande Do Sul, como foi rever o pessoal e conhecer gente nova? Contem mais sobre a experiência:

Lauro: Cara o sul sempre nos acolheu de forma impressionante. Nos sentimos tão a vontade que parecemos membros da família.

Marcelo Papa: Acabemos criando alguns amigos importantes por ai. Laura, Amanda Paz, e Renato CxFxCx  são alguns deles. Com o Renato, mantemos sempre contato, ele  tbm já fez um clipe pra gente e outro está por vir. Nessa ultima passagem, conhecemos o pessoal do Studio Navarro e vimos muitas afinidades também. Nos cederam a casa pra ficar e estamos mantendo contato sempre. 

Já que falamos da cena no RS, que vocês já sabiam das bandas daqui, já gostavam de alguns grupos? Quais grupos curtem e tal e se conheceram alguma banda nova nessa turnê que impressionaram?

Lauro: tem varias bandas ai no sul que são fodas. Dessa ultima vez conheci o Chute no Rim e o Charlar que me impressionaram. Ainda não tinha tido a oportunidade de conhece-los e agora pude curtir de perto. Cara nesse turne achei foda uma banda de Brasilia chamada Dead End. Em Joinville assistimos um show de uma banda chamada Zombie Cookbook, muito foda, pik death metal old school.

Marcelo Papa: Eu cito o “DCH”, de Bastos, interior de SP. Molekada com aquele sangue no olho que a gente tinha quando começou. Pelo mesmo motivo, cito o “George Romero” de Mato Grosso do Sul, grandes pessoas que movimentam as cenas locais. O “Reiketsu” tbm é uma banda que me impressiona todas as vezes que eu vejo. 


O Bandanos já teve também uma certa fama fora do metal, o curioso caso do Cão Zeca. Aos que não sabem, o Cris pode explicar a história e se rola ainda uma galera que se comove com essa história após tanto tempo. Aliás, ia rolar um projeto sobre um livro com essa história, não?

Cristiano: A historia envolvendo o Zeca, foi algo muito louco. O prédio onde moro sofreu um arrastão, onde vários apartamentos foram roubados, coisa de filme mesmo. O Zeca, meu cão, acabou sendo levado junto como se fosse mais um  produto do roubo. Nem eu mesmo consigo explicar todo o “fenômeno” que aconteceu. Eu compartilhei a história toda num post “desabafo” no facebook e assim tudo começou... Esse post e essa foto chegaram a mais de um milhão de compartilhamentos e os veículos de comunicação começaram a entrar em contato comigo e todo mundo queria saber da história. Eu acabei aparecendo em todos jornais e canais de TV para contar isso. Enfim, foram 7 dias de agonia e tortura de ficar sem meu filho canino, mas infelizmente devo admitir que o poder da TV nesse caso foi decisivo, pois graças a uma denuncia anônima a policia chegou até o cachorro que estava  a dezenas de quilômetros da minha casa, em um bairro totalmente afastado e ele acabou voltando. Não creio que isso tenha ajudado o Bandanos de alguma forma, mas as pessoas acabaram associando minha imagem a da banda. Tinha a ideia do projeto do livro sim, chegou a ser desenhado, mas demorou muito e acabou não vingando, pois a história já havia sido esquecida.



Cris Splatterhead, como tu és personal trainer e ligadão na academia, tenho que te perguntar: Léo Stronda ou B - Dynamitze?

Cristiano: Não acompanho nenhum dos dois, mas sei do que se trata, acho que o Stronda foi algo mais de caso pensado, meio jogada de marketing mesmo, o outro mano foi por acaso, nem ele imaginou que se tornaria “ícone pop” dentro do meio da musculação. Tem o lado bom e ruim dessas figuras, que seria a popularização da cultura e estilo de vida dos praticantes de musculação e atletas, mas acho que a maioria das coisas que eles devem dizer, é  um monte de abobrinhas...haha. Como disse, não sigo e nunca assisti nenhum dos dois.  O assunto pra mim é muito sério, é meu trampo e eles não trazem nada muito novo em relação ao que vivo todos os dias. Treinamento é uma ciência, coisa séria e que poucos realmente dominam e sabem o que estão fazendo, logo esse tipo de abordagem que eles praticam, as vezes polui o ambiente com falsos conceitos e ideias ruins.


Agradeço ao vocês pela entrevista e deixem seu recado final aqui:

Marcelo Papa: Muito obrigado pela entrevista! Somos grandes fãs das mídias independentes e se não fossem por elas, não teríamos nem metade da cultura underground que adquirimos hoje em dia. Siga firme! Grande a abraço pra você e pra todos que estão lendo. 

Fique abaixo com um vídeo especial que eles fizeram recomendações pra galera:



Para saber mais de Bandanos, acesse:
www.facebook.com/bandanoscrossover (facebook)
@bandanoscrossover  (instagram)
Bandanos.bandcamp.com (bandcamp)

Earth: Imprimindo no método infernal

                           

Capitaneada por Dylan Carlson, o Earth foi formado na cidade de Olympia (vizinha à Seattle) no início da década de 90. Sem vocalista e tendo como base a guitarrra minimalista e viajera de Carlson, a banda soa como um alienígena, sendo difícil de classificá-la em qualquer ‘cena musical’.

O nome ‘Earth’ foi escolhido porque esse foi usado pelo Black Sabbath em seus primeiros dias. Lembrando que a  banda de Toni Iommi era cultuada em níveis obsessivos na região noroeste dos Estados Unidos por esse período.  Mas apesar da inegável adoração,  eram  diferentes de qualquer coisa stoner ou doom. Colocando drones em evidência como nenhuma outra banda de rock pesado havia feito antes, criaram um novo estilo musical, que já foi rotulado de Ambient metal, Drone metal e Drone doom.

Os drones, que  são notas, acordes ou progressões  repetidos à exaustão para criar um efeito hipnótico,foram usados pela primeira vez pelo compositor minimalista La Monte Young nos anos 50.  No universo metálico, o próprio Black Sabbath e os Melvins foram os que mais utilizaram desse recurso, porém não como razão de ser do seu trabalho.
Dylan Carlson (de pé) , Kurt Cobain e Mark Lanegan: Bonde da Orgia de Travecos
O primeiro trabalho, o EP “Extra-Capsular Extraction”, já chama muito a atenção pela ousadia  da proposta, percebendo-se combinações bem díspares: riffs na linha Sabbath, o estrondo dissonante do Throbbing Gristle,  longos improvisos guitarrísticos à Neil Young e o space rock de grupos como Hawkwind e Pink Floyd . Nesse disco há a participação de Kurt Cobain fazendo alguns vocais e guitarras. Dylan era um dos melhores amigos de Kurt. Ironicamente foi quem vendeu a ele a  arma usada em seu suicídio.


O próximo lançamento, "Earth 2" é o ápice do radicalismo sonoro adotado pelo Earth. Feedback e distorção sem trégua nas três faixas que compõem o disco, que soam como se  o Melvins estivesse fazendo uma versão de ‘Sister Ray”,do Velvet Underground..  Earth 2 é considerado pela crítica como seu disco mais importante e definitivo.


Em 1996 vem  um disco com estrutura mais convencional, "Pentastar: In the Style of the Demons" , com clara influência grunge. A densa e robótica  faixa de abertura entrou na trilha sonora do filme ‘Kurt and Courtney’, em que o próprio Dylan Carlson aparece dando entrevista em estado lástimável, com feridas na pele e fala desconexa. Ele passava na época por um pesado vício em drogas.
Dylan Carlson em "Kurt & Courtney"
Por conta dos problemas de Dylan,  passam quase 10 anos sem gravar. Somente em 2005 vem  “Hex; Or Printing in the Infernal Method”, que marca um novo direcionamento artístico, saindo um pouco do barulho  e seguindo com uma maior preocupação em criar música mais climática, começando a mostrar forte  influência de country, folk e jazz. As trilhas sonoras de filmes  ‘western spaggheti’ e a clássica abertura do seriado Twin Peaks são as primeiras coisas que vem à cabeça ao ouvir esse álbum.


O duplo “Angels of darkness, Demons of light” inova ao incorporar violino à sonoridade do grupo e que miraculosamente não atrapalha o som da banda. Dai para frente passam a contar com uma violinista em turnê.  

Seu último lançamento até agora,  “Primitive and deadly”, saiu  no ano passado , tendo vocais em algumas faixas, dessa vez o convidado ilustre sendo o Mark Lanegan.  Disco maravilhoso. Destaca-se também a arte de capa do lp, uma das mais bonitas deles, que sempre capricharam muito nesse quesito.


Com Dylan Carlson sob controle, excursionando e lançando  álbuns muito bem recepcionados por fãs e crítica, o Earth colhe hoje um pouco do reconhecimento que sempre lhe fora devido. Só nos resta torcer (e assinarmos muita petição on-line) para que façam uma turnê aqui.


World Damnation - três faces do metal extremo gaúcho


Recentemente me mandaram o three way split (para os que não sabem, é um album no qual o repertório é dividido por mais de uma banda, não confunda com coletânea). O split conta com três bandas gaúchas: Impetus Malignum, Natural Chaos e Human Plague. Hoje farei um rápido comentário desses grupos e seus respectivos setlists no disco, desfrutem:

NATURAL CHAOS


Formado em 2007, a banda de Porto Alegre conta com quatro membros: Sidney "Sapão" Benites no baixo e vocais, Carlos "Indulgence" e Anderson "Gt" nas guitarras e Paulo Peixoto na bateria. O quarteto faz uma mescla de death/thrash bem velha escola, na linha de nomes como Morbid Angel, Sepultura e Slayer. Detalhe que o grupo gravou todas as músicas num home studio próprio, com uma produção bem interessante e que remete bem ao metal extremo old school.

No split, já abrem com a canção Carnage, com blast beats e palhetadas alternadas acompanhando os guturais gravíssimos de Sidney, foi impossível não se lembrar de Incantation escutando esse som. Em seguida chega Sacrifice Of Consciousness, que já começa com um riff bem memorável e skank beats, perfeito para iniciar um mosh ou circle pit. Pra encerrar sua participação no split, a faixa Chaos é facilmente é mais rápida e agressiva das três, com bastante influência do Sepultura velha escola e Massacre.


Em comparação ao que é visto na cena gaúcha, o Natural Chaos sem dúvida tem um apelo forte pro Death Metal Old School. As três faixas tem uma média de 5 a 6 minutos, mas as mudanças de tempo, peso e riffs pegajosos deixam o ouvinte interessado. Com certeza um contraste legal, pois quem conhece a cena por aqui nota que o Death Metal está bem cheio de bandas técnicas e velozes que buscam ser o novo Krisiun, logo bandas como essa que usam de tempos mais lentos de vez em quando são sempre bem vindas.


HUMAN PLAGUE


Formado em 2011, o grupo de Santa Maria é a banda mais "nova" que consta no split. O álbum abre com Below The Nothingness, com um riff mais cadenciado e bumbos duplos pesados, nota-se que eles têm mais influência nas bandas de death da cena européia (essa canção no caso me lembrou bastante Hail Of Bullets). Em seguida Silent War continua com uma linha um pouco mais melódica e o pedal duplo ataca novamente, dessa vez se nota uma forte veia de death metal sueco na linha do Unleashed, sem falar do belíssimo solo que acompanha esse som. 

Por último, entra a faixa Hate Celebration, que inicia com sirenes, teclados e o som de marchas e metralhadoras, que dão entrada ao som mais pesado e agressivo da parte deles nesse split. Pura bateção de cabeça e a faixa se encerra com blast beat, pedais duplos e mais velocidade, o que contrasta com o setlist que apresentavam, uma bela surpresa.


No fim, o Human Plague apresenta um Death Metal mais na linha das bandas européias dos anos 90/2000, a produção é bem limpa e clara, músicas bem cadenciadas e lentas. Dou um destaque pra faixa Silent War e seu solo realmente sensacional!

IMPETUS MALIGNUM


Sem dúvida a banda mais experiente nesse split, o grupo de Porto Alegre já tem 2 álbuns e bastante splits no currículo. Tocando um black metal na linha das bandas da segunda onda como Marduk e Gorgoroth, eles são responsáveis pela parte mais caótica e massacrante de ouvidos nesse split. Já iniciando o massacre com Slave Of Prophecy, atacando o ouvinte de surpresa com blast beats e palhetadas alternadas invocando melodias sombrias. 

Em seguida entra Storms Of Fire, com uma pegada bem war metal no estilo Goatpenis e Impaled Nazarene. O assalto continua com Death Ride, com um refrão pegajoso pra caralho, logo o setlist se encerra com Vatican Judgement, com uma produção mais lo-fi e arquetípica do gênero, porém os riffs e solo nessa faixa de encerramento são ótimos, também é a música  mais variada do repertório deles.


Impetus Malignum apresenta o repertório black metal pós 90's que interessa aos fãs de grupos como Marduk, Gorgoroth, Endstille, Impaled Nazarene e afins. Única reclamação que eu teria é que se nota que as quatro canções foram gravadas de formas diferentes, porém mesmo com as mudanças notáveis de produção, isso não desvaloriza o peso das músicas. Meu destaque fica pra faixa Vatican Judgement.

Bem, esse foi o three way World Damnation, representa três facetas diferenciadas do metal extremo gaúcho. Todos os grupos tem seus diferenciais aqui na cena local, o split é recomendadíssimo para os fãs dos respectivos gêneros. Vocês podem adquirir sua cópia nos distros que o lançaram: Petrol Music e Rock Animal.

O Ruído Sinestésico do Oxbow

                                     

O Oxbow foi formado na Califórnia no final da década de 80 e é um dos combos mais atípicos e extraordinários já surgidos. Liderado pelo vocalista negro, praticante de luta amadora e também escritor Eugene Robinson, conseguiram a partir da herança de bandas barulhentas como Big Black e Birthday Party criar uma sonoridade bastante particular.  Sua música muito visual e a versatilidade da voz de Eugene, dão a sensação de estar  dentro de um filme ou jogo de realidade virtual.  Poucos conseguem abordar musicalmente sentimentos conflitivos  de forma tão talentosa quanto o Oxbow: ataques de fúria desesperada alternam-se com atmosferas melancólicas, sinistras e sexy com uma naturalidade que impressiona. É música para pessoas fortes, já que não pegam leve em nenhum momento com o ouvinte. O próprio nome da banda, que em inglês significa “jugo” ajuda a  dimensionar essa proposta.
 
                                

Estrearam em disco em 1989 com “Fuckfest”, em que as letras foram retiradas de um bilhete de suicídio escrito por Eugene. O disco, que começa dando uma falsa impressão de ser um Bad Brains fase Quickness (a primeira música, "Curse") mostra o que seriam os álbuns seguintes: forte influência de jazz, tensão, punch brutal e transtorno bipolar. Dizer que Eugene é um Henry Rollins negro é justo. O gosto pela maromba, spoken words e a necessidade de provocar seu público são características de ambos os vocalistas (Eugene, tira as roupas durante as apresentações, terminando por ficar só de cueca; e não poucas vezes já saiu na porrada com seu público). Acrescento dizendo que o Oxbow é tudo o que a Rollins Band quis ser musicalmente, mas nunca conseguiu. Sorry, Mr. Rollins.
 
                                  

“King of the jews”, o próximo lançamento tem na capa uma foto do cantor e ator Sammy Davis Jr. Sammy, judeu negro que teve uma vida no geral bastante trágica e figura controversa (dentre as muitas curiosidades, era membro da Igreja de Satã) representa bem o espírito do Oxbow.
 
O "Rei dos Judeus" 
Mais quatro álbuns se seguiram: “Let me be the woman” (título sugestivo!), “Serenade in red”, “An evil heat” e “The narcotic Story”. Todos peças magistrais e que valem tudo serem ouvidos. Trabalhando em cima de temas ligados quase sempre ao amor que sempre vai embora ou mesmo que nunca aparece, o som  é faca na carne como poucas vezes foi feito. Participações especiais de gente como Lydia Lunch e Marianne Faithfull dão uma pista do nível de qualidade do grupo.
 
                              

                              

Falando de gente famosa, Eugene Robinson participou do projeto Black Face, com o ex-baixista do Black Flag  Chuck Dukowski.

O Oxbow promete disco novo ainda para 2014 e já tem até nome “The Thin Black Duke”, uma referência ao personagem, “Thin White Duke” do David Bowie. Podemos esperar por mais cinco dedos no meio do cara de pura categoria e brilhantismo.
 
                                   

Masters of Reality: Plebéias da Idade da Pedra


Há muito tempo lia em um lugar ou outro sobre o Masters of Reality, mas por algum motivo nunca havia tido interesse em conhecer a tal “banda de stoner rock do Chris Goss”, que para quem não sabe, é o produtor de grande parte do material do Kyuss e do Queens of The Stone Age. O possível motivo desse meu desdém é que bandas do estilo  se multiplicaram aos milhares e como o estilo se baseia em soar vintage e reverenciar uma época, acabam muitas vezes se limitando ao que já foi feito e resultando em trabalhos previsíveis e irrelevantes. Para cada banda com personalidade que aparece, há dezenas de milhares de bandas que não acrescentam absolutamente nada e que a característica retrô soa forçada. Bom, esse não é mesmo o caso do Masters of Reality. Há alguns meses, por encontros felizes que só o acaso traz, tive contato com o trabalho deles, em links do youtube e fiquei totalmente bestificado pela excelência e identidade do som. Não é exagero dizer que são um dos segredos mais bem guardados da história do rock. 
 

A banda foi formada em New York no ínicio da década de 80 e ainda existe, tendo durante todo esse tempo diversas encarnações, sendo que o único integrante que permaneceu em todas elas é o já citado Chris Goss, que é seu líder, vocalista, guitarrista e mentor espiritual. Goss tirou o nome da banda do  título do 3º álbum do Black Sabbath, que é considerado como o marco zero do stoner.
 
Com uma sonoridade que nada tinha a ver com a década de 80, dominada pelo glam, só foram gravar seu debut em 1989; graças a uma demo que caiu nas mãos do sabbathmaníaco Rick Rubin, que se interessou em produzi-los. O resultado é uma estréia sensacional. O álbum, autointitulado, tem riffs e mais riffs empolgantes e cheios de groove que beberam da fonte dos primeiros trabalhos do Led Zeppelin e do Experience do Hendrix, mas que não soam como cópias ou requentados. Goss é um grande criador de melodias assobiáveis, bem no estilo Beatles, que é uma das maiores qualidades do som, o que faz as músicas soarem bem diferentes entre si. Outra coisa que chama muito a atenção é a semelhança dos vocais de Goss com os do Josh Homme (que claramente surrupiou seu estilo vocal), o que faz parecer por diversas vezes que estamos ouvindo o QOTSA. Conseguiram um mini-hit com esse disco, “Domino”, que entra na trilha sonora do filme “Marcado para morrer” do astro de filmes de ação Steven Seagal.
 

Com as conexões no meio musical do Chris Goss, trazem  para o segundo álbum, “Sunrise to sufferbus”  a participação do lendário baterista do Cream, Ginger Baker;  que não chega a sair em turnê com eles. O som fica um pouco mais blues que no primeiro álbum fazendo lembrar em alguns momentos o protometal da ex-banda de Baker.  Mas “Sunrise...”  está no mesmo nível de qualidade do anterior. Isso prá não dizer que o resultado ficou ainda melhor e que talvez seja seu melhor disco. Impecável.
 

Mais concentrado na carreira de produtor que paralelamente desenvolvia com o Kyuss, Chris Goss passa a primeira metade da década de 90 deixando o Masters of Reality em segundo plano, gravando materiais esparsos (que mais tarde seriam compilados no disco “The Ballad of Jody Frost”) e fazendo poucos shows.
 
Masters com Ginger Baker (à esquerda)
Em 97 o MOR retorna com o menos inspirado “Welcome to western lodge”, e em 2001 com o noiado “Deep in the hole”. Esse último tem participações de Josh Homme, Nick Oliveri e Mark Lanegan, que então estavam no auge da drogadição e com isso percebe-se a mudança da banda dos climas mais up para coisas mais melancólicas e cheias de paranóia, principalmente nas faixas com participação do Lanegan. Dessa turnê vem também um dos melhores álbum ao vivo já gravados,"Flak n' Fight" que transmite muito bem o clima caótico, poderoso e imprevisível  das apresentações. Mal comparando, lembra um pouco a psicodelia sujona e o clima de insanidade do também ao vivo “Space Ritual”, do Hawkwind.
 

Em seguida temos o lançamento de "Give us Barabbas", que é uma compilação de várias músicas já gravadas pela banda num formato mais acústico. Um belo disco, mas que destoa um pouco dos anteriores.
O último disco gravado, “Pine Cross/Drover” retorna ao caminho do peso e é  também um trabalho bem interessante, mas sem maiores destaques.
 
Nick Oliveri, Chris Goss e Josh Homme
Com no mínimo quatro obras-primas e o restante variando de bom a excelente, vale a pena conhecer toda a discografia deles. Goss continua bastante ativo e participando de um milhão de projetos, o último deles do disco de estréia do Mojave Lords (nova banda de seu amigo Dave Catching e o melhor lançamento de 2014, até agora).
 

O Masters of Reality serve de inspiração não só para fãs de stoner ou mesmo de rock, mas de todo fã de boa música. É um tipo de pureza e autenticidade raras num universo que a cada dia se torna mais venal.